Eleanor Rigby


Fui à praia.
  No meio da praia estava uma pedra.
  A pedra não era grande nem era pequena. Não era preta nem colorida. Não era um seixo nem era uma rocha. Não era basalto, nem granito nem calcário. Não tinha lapas, nem limos nem caracóis do mar. Não tinha buracos nem arestas. Era uma pedra e estava sozinha no meio da praia.
  Sentei-me com ela. Não me sentei em cima dela, embora o pudesse ter feito: não tinha buracos nem arestas nem limos, e não era demasiado pequena ou demasiado grande. Mas sentei-me com ela e a pedra sorriu-me.
  Não lhe liguei, mas não me levantei. E a pedra também não. Ali ficámos, lado a lado, a olhar a areia e as dunas, de costas para o mar.
  E a pedra disse-me:
  - Sinto-me sozinho.
  Não perguntei porquê. Não costumo falar com pedras, ainda menos desconhecidas, mas não me levantei.
  - Não sinto frio nem sinto dor, mas sinto-me sozinho. Não sei como vim parar ao meio deste areal. Acho que sempre aqui estive, escondido debaixo da areia, mas agora que me descobri, sinto-me só.
  Não respondi. Não era uma pergunta.
  - As pessoas passam pela praia e caminham à minha volta. O mar vem e vai, cobre-me e descobre-me duas vezes por dia, mas ignora-me. Não é simpático, o mar. Bate-me constantemente, arrefece-me e molha-me. Não faz mal, porque não sinto dor nem sinto frio, mas fá-lo com desprezo. Traz areia e leva areia, mas a areia também me ignora. São muito chatos todos aqueles grãozinhos pequeninos a falar muito depressa uns com os outros nas suas vozinhas esganiçadas. Sempre com intrigas e coscuvilhices e discussões mesquinhas. As suas conversas não me interessam, mas aborrece-me que me ignorem. Juntam-se todos à minha volta, e depois ignoram-me, como se eu não estivesse aqui.
  Compreendi o seu ponto de vista. Também conheço gente assim. Mas não me manifestei.
  - E depois há a gaivota.
  Arrebitei as orelhas.
  - É a pior de todas. Vem de manhã, muito cedo, antes das pessoas chegarem à praia, e pousa em cima de mim. Depois grasna, guincha e pipila sem parar. Depois caga-me em cima e vai-se embora. É humilhante. Mas não me fala. Nenhum deles me fala. Ainda bem que se sentou comigo. Sinto-me menos sozinho.
  Ia confortá-lo, mas calei-me. Depois levantei-me e vim embora. Afinal que tipo de maluco é que fala com as pedras?

Comentários

Mensagens populares deste blogue

O Fado da Desgraçadinha

Libertad O Muerte

O Insurrecto