Orientação Profissional

- Filho, o que queres ser quando fores grande?
- Ainda bem que perguntas isso, pai. Eu quero ser rabejador.
- Rabejador? Ó filho, mas que raio de profissão é essa? Isso não é profissão de futuro. Tu não sabes que querem acabar com as touradas?
- Ó pai, eu tenho orgulho nas minhas raízes étnico-culturais. É uma coisa que me define. Pensei fazer rendas de bilros, ou chocalhos, mas a minha vocação é mesmo rabejador. Sinto-o nas veias, a pulsar-me nas entranhas.
- Sim, filho, compreendo-te, todos nós sentimos essa pulsão de rabejar, mas tens que pensar no teu futuro. Ser rabejador não garante que venhas a ter uma vida estável. Já pensaste que quando quiseres fazer um crédito à habitação te perguntarão a tua profissão? E que dirás tu? "Sou rabejador". "É rabejador do quadro, vinculado ou contratado?" - perguntar-te-ão. E tu que dirás? Não há quadros de rabejadores, queria queixar-me ao sindicato, mas também não há um sindicato de rabejadores. Os rabejadores são discriminados, ninguém luta pelos nossos direitos. Tentámos fazer uma marcha pela Avenida da Liberdade, mas não nos autorizaram. Tiveram medo que encravássemos o trânsito. Nem mesmo o Bizet fez uma ária chamada Rabejador. E teria ficado muito bem:

Rabejador, en garde! Rabejador, Rabejador!
Et songe bien, oui, songe en combattant
Qu'un oeil noir te regarde,
Et que l'amour t'attend,
Rabejador, L'amour t'attend!
Et songe bien, oui, songe en combattant
Qu'un oeil noir te regarde,
Et que l'amour t'attend,
Rabejador, L'amour t'attend!

- Mas, paizinho, eu nunca quis ser bombeiro ou astronauta ou jogador de futebol... Tudo o que eu quero ser é rabejador. Porque não o posso ser? Porque haverá gente tão vil que me impeça de concretizar o meu sonho, eu que sou tão novo e nunca fiz mal a ninguém?
- Lamento, meu filho, mas assim é a nossa gente. Se quiseres podes fazer tapetes de Arraiolos ou pastéis de Tentúgal, são igualmente étnicos e não ofendem as minorias, mas rabejador, é que não pode ser.
- Mas não haverá um Curso de Educação e Formação de Rabejador? Algo assim prático..
- Talvez haja, meu filho, lá para a Moita do Ribatejo ou Vila Franca de Xira, mas nós não temos posses para te mandar estudar para um sítio desses.
- Mas se os outros meninos vão para Braga, ou Castelo Branco, ou Coimbra...
- Sim, mas não vão ser rabejadores. Serão solicitadores ou designers de interiores ou nutricionistas, e para isso há subsídios e apoios. Para rabejador não há nada, e nós não podemos suportar a despesa.
- Então terei que ser assessor de imprensa ou relações públicas?
- Receio que sim, meu filho. Não há futuro na rabejação.
- Mas as minhas raízes étnico-culturais...
- Olha, filho, se fazes tanta questão disso vamos mandar-te estudar nas Caldas.

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